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Ronaldo Fraga: ele é ouro!

O estilista, que prioriza a matéria-prima nacional e exalta valores regionais, comenta sua participação nos Jogos Paralímpicos do Rio

A moda de Ronaldo Fraga vai além das tendências – ela propaga cultura, dialoga com a atualidade e conta histórias. Na edição do SPFW em 2015, cinco refugiados subiram na passarela do estilista mineiro para o desfile Re-existência, que criticou a intolerância aos imigrantes e negros. Recentemente, criou alguns figurinos – e o desenho de um coração que emocionou o público – para os Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro. Apaixonado por nossa cultura, Fraga prioriza a matéria-prima nacional e exalta valores regionais em suas coleções, com as quais já homenageou, por exemplo, o escritor Guimarães Rosa. Nós, que amamos moda, agradecemos.

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Você exalta a cultura brasileira em seu trabalho. Como é o seu processo de criação? 
A base de qualquer autoralidade é seu repertório. Sinto-me seguro para falar da minha cultura, que ainda pode render inúmeras coleções. Por mais que eu mergulhe profundamente na cultura brasileira, sempre tem o que descobrir. Tenho uma predileção por coleções etnográficas (que falam da cultura e das características de um povo), mas tudo pode render moda: uma obra literária, uma música e até algo não tem nada a ver com esse universo, como a história dos refugiados, tema da coleção do SPFW N41. 
O que te inspira? 
Costumo dizer que moda é um veículo extremamente plural. Eu, particularmente, me interesso pela face políticocultural e em dialogar com o tempo presente. Não me interessa o passado e nem o futuro. A moda tem que ilustrar o que vivemos. Era um risco abordar o tema dos refugiados, podia parecer promoção. Mas, desde o início da carreira, nunca fui de ter medo. O desfile Re-existência já foi para Angola e, em novembro, vai para a Argentina. 
As pessoas têm dificuldade em associar moda à cultura? 
No Brasil, a moda não é entendida como vetor cultural nem pelo próprio setor. Essa é uma discussão nova, que precisa amadurecer para chegarmos aos pés dos belgas e japoneses, por exemplo. Nesses lugares, a moda revela a cultura do país, tanto quanto a gastronomia. É um raio-x. 
Como é a sua produção hoje? 
É pequena, o que me permite fazer outros projetos, como o figurino dos Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro. Se eu tivesse uma estrutura maior, não poderia fazer esse tipo de trabalho, que também me alimenta enquanto autor. 
Quando e como começou o trabalho do figurino dos Jogos Paralímpicos? 
Comecei a trabalhar no figurino da Paralimpíada há um ano. A princípio, ia fazer apenas a roupa da porta-bandeira. De repente, fui ganhando cada vez mais blocos, inclusive a ilustração executada pelo artista plástico Vik Muniz. 
Você exalta a matéria-prima brasileira e as técnicas artesanais em um mercado onde o fast fashion cresce desenfreadamente… 
O fast fashion permite que as pessoas consigam satisfazer seu desejo de moda, já que o custo não é alto. As marcas fast fashion gringas pingam sangue porque praticam um preço impossível, o que envolve mão-deobra escrava e até infantil. Recentemente produzi uma coleção para a Pompéia, fast fashion do Rio Grande do Sul. Visitei a fábrica, verifiquei a qualidade do serviço e de trabalho e vi que as pessoas ganham corretamente pela produção. Isso é o ideal. Mas as pessoas estão começando a entender o valor de pagar pelo cuidado que a produção em massa não oferece. Hoje, o luxo é o autoral, e não está no shopping.